Um português foi condenado a prisão perpétua pela morte da namorada, e depois acabou absolvido.
Um ano depois de ter regressado à sua casa no Feijó (Almada), após provar a sua inocência às autoridades do Reino Unido, Nicolas Bento, o emigrante português que chegou a ser condenado a prisão perpétua, acusado de ter assassinado a namorada em Inglaterra, ainda mistura sentimentos díspares. Entre a amargura dos pesadelos, revolta e dor consegue encontrar a alegria de quem tem uma vida livre pela frente.
Quando a 9 Julho de 2009 Nicolas Bento recebeu a notícia de que tinha sido finalmente libertado pelo Tribunal da Coroa de Luton, que declarou a sua inocência por falta de provas no caso de homicídio, estava longe de imaginar que iria ser "tão difícil" seguir em frente com a vida. Afinal, esteve preso dois anos e meio na ala destinada aos criminosos mais perigosos. Tinha sido condenado dia 25 de Julho de 2007 pela morte da namorada polaca Kamila Garsztka.
No dia de 24 de Julho de 2009 entrou heroicamente no bairro do Chegadinho, onde residia com a família, na Rua Almada Negreiros, garantindo que a partir dali iria viver "uma vida nova", que seria "um novo começo". Hoje, mesmo com o apoio psicológico que tem recebido, ainda há medos e imagens obscuras que o perseguem. "Isto não é uma coisa do passado, é bem presente. É um grande sofrimento e uma ferida que está aberta. Não sei se algum dia vai fechar, por mais anos que viva", desabafa. Entre os vários conflitos que o perseguem, Nicolas esbarra com uma pergunta incontornável: o que terá acontecido à namorada?
Nem por isso deixa de reconhecer que "a vida é linda" e que a tenciona "aproveitar ao máximo", sobretudo agora que está na iminência de ser pai, o que lhe renova as "forças" para continuar a lutar.
Hoje, com 31 anos, Nicolas aguarda pela chegada do primeiro filho com a jornalista da RTP Patrícia Lucas, que realizou várias reportagens sobre o drama vivido pelo actual companheiro em solo britânico, com quem viria escrever o livro Inocente/Not Guilty, que conta os vários pormenores deste erro judiciário em Inglaterra.
Entretanto, anuncia para breve a abertura em Lisboa, onde reside, de um estúdio audiovisual. "Estou a estudar para isso", revela, admitindo o seu gosto pela fotografia, além do invulgar jeito para o desenho.
Diz que o importante é procurar reconstruir o que a justiça britânica um dia deitou por terra, mesmo numa "guerra constante" em que não consegue encontrar a paz. "Bastava-me ter recomeçado do zero para já ter a vida facilitada. Mas eu estou a recomeçar muitos furos abaixo do zero. O que me fizeram destruiu-me em termos pessoais, financeiros e psicológicos", garante de voz embargada, sem perder a esperança de vir a ser ressarcido pelo cativeiro para onde foi "atirado".
Não revela quanto reclama à justiça do Reino Unido, mas assegura que o pedido de indemnização está em marcha. Reconhece que o processo vai ser moroso, mas garante com serenidade que não lhe falta paciência para esperar. Porquê? "Se estive lá dentro tanto tempo sempre com esperança de um dia chegar cá fora, agora que estou em liberdade não me importo de aguardar muito mais. Esta indemnização é muito mais que um simples número. É uma causa."
Fonte: DN de 2010.07.18
UM COMENTÁRIO: E se tivesse sido condenado à morte?
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