Cafés com o nome "O NOSSO CAFÉ" encontram-se a miúdo em várias terras. Aqui na cidade do Porto pelo menos dois recordo-me eu, ambos já finados.
Mas aquele que aqui quero trazer à liça situava-se junto ao Campo 24 de Agosto no Porto. Tinha duas entradas, uma pela Av. Camilo, mesmo ao lado do busto do escritor, e outra pela Rua do Bonfim. Era de um formato tipo comboio tal como a sala de jogos ao lado.
Seu proprietário, o Senhor Fontes, oriundo de terras de Cinfães tinha presença assídua só para visionar o bom andamento do seu café. Tinha subido na vida a pulso depois de ter passado as passas do Algarve segundo um dia me pode testemunhar.
O café era frequentado por estudantes que tinham devidamente identificado o local para o marranço. Tinha um horário alargado até às duas da matina como muitos outros estabelecimentos do género pela cidade. Actualmente quase todos fecham a partir das oito da noite, hora a partir da qual a cidade começa a ficar entregue a si própria, às moscas.
Era dotado duma instalação sonora para chamar os clientes ao telefone:
“Sr. Engenheiro fulano…. ou Sr. Dr. sicrano… faça o favor de chegar ao telefone” (actualmente todo o gato sapato tem telemóvel para ser contactado). Imagine-se o sururu que era ver o detentor de tal deferência levantar-se e ir cheio de nove horas atender a chamada, pois na altura eram poucos os letrados. Agora nos tempos que correm não faltam por aí engenheiros a dar com um pau!... Há por aí cursos em todo o bicho careta e alguns são autênticas trapalhadas como tem vindo a público. Às vezes do outro lado da linha, a título de brincadeira ou talvez não, inventavam uma engenharia para o senhor fulano de tal. Portanto não é só de agora o fabrico e apetência da nossa gente pelos canudos, está intrínseco na maneira de ser de todo o portuga e não é exclusivo do mais pintado. É uma fatalidade pobrezinha de elevação do ego que devemos preservar, são as nossas referências e o nosso cunho personalizado que nos deve diferenciar dos outros povos da comunidade europeia!...
Em consequência de nesse café haver muita estudantada era habitual topar por lá uns figurões da PIDE/DGS, a sede do Porto ficava perto, aparentemente a tomar um café como quem não quer a coisa mas na realidade a sondar se a malta não estaria a urdir contestações à ordem estabelecida. Eram tipos engravatados mais ou menos referenciados pelo maralhal; mais perigosos eram os “bufos” que às vezes estavam ao nosso lado no local de trabalho, eram mesmo uns escroques que se vendiam por dez reis de mel coado, uma pequena tensa que lhes dava a DGS! Eu sei que os tempos eram difíceis e tudo o que viesse dava jeito, mas!... Está tudo mais que absolvido até porque a situação actual do país não é nada famosa – a pobreza está a aumentar com a consequente criminalidade e os ricos são cada vez mais. Isto só serve àqueles que gravitam à volta do poder partidário para açambarcar os melhores tachos ou enriquecendo da noite para o dia a vender quintas que estavam na RAN e deixaram de estar!... Estás perdoado ou quase, Salazar!... o concurso televisivo “os melhores portugueses” foi sintomático do estado de alma da nossa gente. Para mim foi um resultado lógico que fez mexer na cadeira os defensores das amplas liberdades como se isto por si só enchesse barriga!...
O Café “O Nosso Café” já há muito que fechou, o dono já partiu também desta vida, o jardim do Campo 24 de Agosto que fica ali ao lado está descaracterizado devido às obras do metro e nós estamos mais maduros. Restam as memórias!...
(Qualquer semelhança de casos pontuais de títulos honoríficos da crónica com a actualidade é pura coincidência)
Fiquem bem, antonio
Os meus links